A utilização das cores no cinema é um elemento fundamental na linguagem cinematográfica. Desde a revolução da cor no cinema, há quase 100 anos, os cineastas utilizaram as cores para contar histórias de forma mais rica e vibrante, sendo um dispositivo chave para a expressão de sentimentos e emoções, além de ser um elemento importante na comunicação com o público.
A cor é uma ferramenta importante para os cineastas manipularem a percepção e as emoções dos telespectadores. Eles utilizam as cores para criar efeitos visuais específicos, para indicar mudanças na narrativa e para comunicar simbolicamente ideias e conceitos.
As paletas de cores dos filmes podem mudar de acordo com a evolução da história e o estado emocional dos personagens, a fim de intensificar a experiência cinematográfica.
Conheça 6 exemplos de como o cinema utiliza as cores para criar atmosferas e transmitir mensagens
Matrix (1999)
“Matrix” é um filme icônico de ficção científica dirigido pelos irmãos Wachowski, que utiliza uma paleta de cores específica para transmitir as emoções e as nuances da história. A trama se passa em um futuro distópico em que a humanidade vive em um mundo virtual criado por máquinas para controlar suas mentes e seus corpos.
A paleta de cores do filme é predominantemente verde e preta, representando a dualidade entre a realidade e a Matrix. As cenas na Matrix são banhadas em tons de verde, criando uma atmosfera surreal. O verde também é associado à tecnologia, ao dinheiro e ao poder.
Já as cenas na realidade são filmadas em tons de preto, cinza e azul, representando a opressão, a falta de liberdade e a monotonia da vida humana sob o controle das máquinas.
Ao longo do filme, há momentos em que o uso estratégico de outras cores é capaz de transmitir sentimentos específicos. Por exemplo, há uma cena em que o protagonista Neo é confrontado por um grupo de agentes da Matrix em um corredor branco e estéril. A roupa preta e os óculos escuros dos agentes contrastam com o branco, representando a opressão e a falta de liberdade que eles representam. Já a roupa preta de Neo representa sua rebeldia e determinação em enfrentar os agentes e a Matrix.
Outra cena marcante é quando Neo e seus amigos são treinados por Morpheus em um programa de treinamento virtual. Nessa cena, a paleta de cores muda para tons de vermelho, simbolizando o perigo e a intensidade do treinamento. O vermelho também é associado à paixão e à energia, refletindo a determinação de Neo em dominar suas habilidades.
No final do filme, há uma cena em que Neo ascende ao status de Messias e é capaz de enxergar a Matrix como ela realmente é. Nessa cena, a paleta de cores muda para tons de dourado e branco, representando a iluminação e a transcendência que Neo alcança. O uso dessas cores simboliza sua libertação da Matrix e seu papel como salvador da humanidade.
Coringa (2019)
O filme “Coringa“é uma obra-prima do cinema moderno e um exemplo notável do uso da paleta de cores para transmitir emoções e criar atmosferas. A escolha de cores pelo diretor Todd Phillips e pelo diretor de fotografia Lawrence Sher é fundamental para a criação da sensação sombria e opressiva que permeia todo o filme.
Desde o início, é possível perceber a predominância de tons escuros e sombrios na paleta de cores. O preto é a cor principal, e é frequentemente combinado com tons de cinza e marrom, criando uma sensação de opressão e desespero. Essas cores representam a escuridão interior do protagonista Arthur Fleck, que se sente alienado e rejeitado pela sociedade..
À medida que o filme avança, a paleta de cores muda para tons mais intensos e saturados, simbolizando a transformação de Arthur em Coringa. O vermelho é a cor dominante em muitas cenas, e é usado para representar a raiva, a violência e a loucura do personagem. O vermelho também é usado em cenas de violência extrema, enfatizando a brutalidade dos atos cometidos pelo personagem.
Outras cores, como o verde e o roxo, também são usadas para criar uma atmosfera opressiva e desorientadora. O verde é usado em muitas cenas que retratam Gotham City, criando uma sensação de decadência e corrupção.
O roxo é a cor usada nas cenas que mostram a transição de Arthur para Coringa, e é uma cor que representa a realeza e a extravagância. Essa escolha de cor destaca a sensação de que a transformação de Arthur é uma espécie de ascensão ao poder.
Ao longo do fime, a paleta de cores é usada de maneira magistral para transmitir as emoções e sensações dos personagens. As escolhas de cores ajudam a criar uma atmosfera sombria e opressiva, que reflete as emoções e a psicologia do protagonista.
O uso de cores vibrantes e intensas em cenas de violência e transformação reforça o sentimento de que algo profundamente perturbador está acontecendo. No final, a paleta de cores de “Coringa” é uma parte fundamental da experiência cinematográfica e contribui para a criação de um dos personagens mais icônicos da cultura pop moderna.
A Lista de Schindler (1993)
“A Lista de Schindler” é um filme histórico e impactante que retrata a vida de um empresário alemão que salvou a vida de mais de mil judeus durante o Holocausto. O diretor Steven Spielberg escolheu uma paleta de cores específica para transmitir a sensação de opressão, tristeza e desesperança que permeava a época.
A paleta de cores predominante no filme é o preto e branco. Essa escolha não só enfatiza a tristeza e a dor que os personagens enfrentavam, mas também serve para criar um ambiente histórico autêntico e crível. Além disso, o preto e branco é capaz de transmitir a falta de cores, de vida e de esperança que os personagens enfrentavam diariamente durante o Holocausto.
Spielberg também utiliza cores específicas em momentos estratégicos para transmitir sentimentos diferentes. Por exemplo, há uma cena que se destaca pela sua paleta de cores, em que uma garotinha judia está andando em meio ao caos da deportação dos judeus. A garotinha está vestindo um casaco vermelho brilhante, que é a única cor viva na cena em preto e branco. Esse uso estratégico do vermelho simboliza a inocência da garotinha e, posteriormente, a sua trágica morte nas mãos dos nazistas.
Em um momento marcante, Oskar Schindler olha para o céu e vê a imagem de uma suástica, símbolo do nazismo, em forma de sombra sobrevoando a cidade. A suástica é apresentada em vermelho sangue, como uma representação da violência e do ódio que permeavam a época. A cor vermelha, que representa o sangue derramado pelos judeus, é usada para destacar o horror do Holocausto.
No final do filme, há uma cena em que os atores reais que interpretaram os personagens da história visitam o túmulo de Oskar Schindler e colocam flores. A cena é filmada em cores, como uma homenagem aos personagens e uma mensagem de esperança para o futuro. O contraste com o restante do filme em preto e branco ressalta a importância do trabalho humanitário de Schindler e dos que lutaram contra o nazismo.
A Forma da Água (2017)
“A Forma da Água” é um filme visualmente deslumbrante, que usa a paleta de cores para contar uma história de amor incomum. Dirigido por Guillermo Del Toro, o filme se passa durante a guerra fria e apresenta a história de amor entre uma mulher muda chamada Elisa e uma criatura aquática capturada pelo governo dos Estados Unidos.
Desde o início do filme, a paleta de cores é usada de forma eficaz para criar uma atmosfera subaquática e mágica. O azul e o verde são as cores principais do filme, evocando o mundo subaquático em que a criatura vive. Os tons azul-esverdeados, em particular, são usados para destacar a beleza e a magia do ambiente.
À medida que a história avança, a paleta de cores se torna mais escura e sombria, simbolizando o perigo e o medo que os personagens enfrentam. Quando a criatura é capturada e levada para um laboratório, as cores se tornam mais frias e menos saturadas, criando uma atmosfera assustadora e opressiva.
No entanto, conforme Eliza (Sally Hawkins) e a criatura se aproximam, a paleta de cores muda novamente, agora para tons mais quentes e vibrantes. Isso simboliza o amor que eles compartilham e a esperança de um futuro juntos. Os tons de amarelo e laranja são usados para criar uma sensação de calor e luz, enquanto os tons de vermelho evocam paixão e emoção.
Ao usar a paleta de cores de forma tão eficaz, Del Toro é capaz de transmitir a emoção e a atmosfera do filme sem palavras. As cores ajudam a contar a história e a evocar a emoção, tornando “A Forma da Água” uma obra-prima visual e emocionalmente poderosa.
O Grande Gatsby (2013)
“O Grande Gatsby” é um filme dirigido por Baz Luhrmann que é conhecido por sua estética visual única e extravagante. O filme é baseado no romance homônimo de F. Scott Fitzgerald. A história é contada do ponto de vista do personagem Nick Carraway, um jovem escritor que se muda para Nova York em busca de sucesso nos anos 1920, época da Lei Seca nos Estados Unidos. Ele acaba se envolvendo com o enigmático Jay Gatsby e sua vida de riqueza e festas extravagantes. Mas por trás da fachada glamourosa, Nick descobre a verdadeira natureza de Gatsby e os segredos obscuros de seu passado.
O filme começa com uma explosão de cores vivas e neon, como o rosa-choque, amarelo-limão e verde-turquesa, criando uma atmosfera de festa e excentricidade. As roupas dos personagens são uma mistura de tons pastel e cores vibrantes, como o azul-claro, lilás, verde-musgo e vermelho-vivo, contrastando com o fundo escuro da cidade de Nova York.
À medida que a trama avança, as cores começam a ficar mais escuras e pesadas, simbolizando a tragédia que se aproxima. Quando o protagonista Nick começa a descobrir a verdadeira natureza de Jay Gatsby, a paleta de cores muda para tons mais sombrios como vermelho-sangue, preto e cinza.
Os tons dourados também são usados amplamente, representando a riqueza e o status social dos personagens. Além disso, o verde é uma cor importante no filme, representando o dinheiro e a ganância.
A paleta de cores de “O Grande Gatsby” não é apenas um elemento estético, mas também é um importante recurso narrativo que ajuda a transmitir as emoções e as nuances da história. É uma escolha estilística ousada que acrescenta camadas à trama e eleva o filme a outro patamar.
Laranja Mecânica (1971)
“Laranja Mecânica” é um filme dirigido por Stanley Kubrick que é conhecido por sua visão única e provocativa. O filme é baseado no romance homônimo de Anthony Burgess e é ambientado em um futuro distópico. A história é contada do ponto de vista do personagem principal, Alex DeLarge, um jovem líder de uma gangue de delinquentes que tem um apetite insaciável por violência e hedonismo. O filme começa com uma cena impactante, em que Alex e seus amigos se envolvem em um ataque brutal. A partir daí, a trama se desenrola em uma série de eventos cada vez mais violentos, incluindo estupro e assassinato.
A paleta de cores é composta principalmente de vermelho, laranja e amarelo, criando uma atmosfera perturbadora e desconfortável. As roupas dos personagens também são vibrantes e extravagantes, incluindo as camisas listradas de Alex, que se tornaram um ícone cultural.
À medida que a história avança, a paleta de cores muda para tons mais sombrios, como preto e cinza, refletindo a transformação do personagem principal.
Alex é eventualmente preso e submetido a um tratamento experimental de condicionamento cerebral, o que o leva a uma mudança de personalidade. A paleta de cores também muda, agora com tons de branco e cinza claro, representando a tentativa de reabilitação de Alex e a perda de sua identidade anterior.
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